terça-feira, 31 de agosto de 2010

No MITO



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Hugo Cruz é co-fundador da Associação PELE e um dos intervenientes no MITO Social, uma das novidades desta edição. A par do espectáculo Meto a Colher, fomos aprofundar mais sobre o workshop Teatro, Comunidade e Participação e sobre o papel que o teatro pode desempenhar na (re)construção de uma comunidade.

“Através da arte, do pensamento divergente e criativo, podemos encontrar e construir outros espaços de interacção e realização.”

entreMITOS – O entreMITOS lança este ano uma nova vertente ligada à intervenção o MITO Social. Qual a sua opinião sobre esta vertente que visa promover a reflexão sobre o papel da arte na sociedade, enquanto arma de intervenção cultural?

Hugo Cruz – Na minha opinião esta é uma tendência natural, principalmente no contexto mundial actual que vivemos. Perante uma crise, que se multiplica em “crises” diversas, o caminho só pode ser o da participação e envolvimento das pessoas na procura de soluções conjuntas. A arte, espaço de igualdade, tem aqui um papel incontornável, através dos processos criativos podemos desatar o mundo, encontrar formas eficazes de desmantelar os nós que bloqueiam o seu desenvolvimento. Através da arte, do pensamento divergente e criativo, podemos encontrar e construir outros espaços de interacção e realização. Felizmente os festivais de teatro em Portugal estão também a perceber esta necessidade e a inserir na sua programação este tipo de projectos.

eM – A consciêncialização da educação pela arte começa a ser uma realidade cada vez maior. De que forma é que o contexto comunitário pode ser potenciado pelo teatro?

HC – As comunidades, o local e o próximo estão profundamente desvalorizados no contexto actual. Assistimos, felizmente a uma inversão desta tendência, precisamos de perceber no entanto se este é um movimento genuíno. O teatro é uma forma de comunicar única e que permite identificar numa comunidade o que a faz manter-se unida com uma identidade própria e o que provoca um sentido de pertença em quem a habita. Vislumbrando estas componentes o processo é o de dar um palco privilegiado a esta comunidade, reconstruindo-a através da linguagem teatral, devolvendo-a desta forma, ao seu território e às suas gentes. O teatro pode permitir desbloquear e/ou criar canais de comunicação numa comunidade e reforçar o gostar de ser daquele espaço e viver com aqueles outros.

eM – A Associação PELE é um dos intervenientes desta grande novidade. Qual a abordagem que segue ao trabalhar com a comunidade e para a comunidade?

HC – A PELE tem feito um caminho que procura respeitar sempre as memórias, valores, tradições e saberes de uma comunidade. Procura encontrar-se com uma comunidade numa postura perguntadora, curiosa, desafiadora e não de quem tem a certeza do espectáculo certo para fazer em determinado tempo e espaço. Procuramos não pilhar o património das comunidades e genuinamente construir algo com elas. A proposta da PELE é um enamoramento, um conhecimento mútuo, um cruzar de saber-fazeres até chegar a um resultado que se devolve à comunidade, com uma outra roupagem. Esta postura nem sempre é fácil , exige um alerta constante e segue uma lógica que se estende no tempo que nem sempre é compatível com os tempos dos projectos. O mais difícil é efectivamente encontrar a melhor forma de perguntar às pessoas sobre o que querem falar e como querem falar, qual é a sua urgência. Essa é a nossa procura, seguindo para isso os trilhos dos processos artísticos de construção colectiva.

eM – O que o levou a seguir esta área especifica do teatro?

HC – O encontro com o teatro comunitário teve a ver com o tipo de trabalho que os vários fundadores da PELE já desenvolviam e com uma sintonia sobre uma ideia do que é arte e como ela se constrói. De uma forma mais racional temos vindo a perceber que o desafios deste tipo de trabalho passam por princípios que nos norteam enquanto colectivo, nomeadamente a ética, dar um palco aos não-lugares e à cultura popular. Para além disso, o espectáculo teatral permite o cruzamento de diferentes linguagens de uma forma única e integradora, daí a importância dos fundadores e colaboradores da PELE terem diferentes proveniências.

eM – O nome da conversa e workshop em que participa intitula-se Teatro, Comunidade e Participação.
Em que sentido é que “somos todos atores”?

HC – Num sentido mais geral somos todos atores da nossa própria vida, escrevendo a narrativa que vivemos. Em projectos de teatro comunitário as pessoas tem uma oportunidade de reencontrarem a sua narrativa, assumem em primeiro lugar uma função própria, especifica, diferenciadora dos outros. É neste sentido que cada um encontra a sua função na construção de um projecto. Numa fase posterior sobem ao palco e experimentam o teatro numa outra perspectiva, este é apenas mais um importante passo dum processo mais amplo de empoderamento do individuo.

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